NOSSA LUTA

segunda-feira, 23 de julho de 2012

QUEM DEFENDE A MINHA FILHA?



Objetivo: destacar a importância da síndrome de alienação parental sob o enfoque da Ciência Jurídica. Aspectos abordados: 1. conceito; 2. causas determinantes do processo de alienação; 3. graus e extensão da alienação; 4. meios para obter a alienação parental; 5. elementos de identificação da alienação parental; 6. conseqüências da alienação parental; 7. a repressão judicial à alienação parental; 8. o papel do advogado diante da alienação parental. Conclusões: identificar a alienação parental e evitar que esse maléfico processo afete a criança e se converta em síndrome são tarefas que se impõem aoo Poder Judiciário. O advogado que milita na área do direito de família deve priorizar a defesa do menor, mesmo quando procurado pelo genitor alienante para a defesa de seus direitos, inclusive com a recusa ao patrocínio da causa do progenitor alienante.
Descritores: Maus tratos infantis. Leis. Ética. Criança
Abstract
Objective: to highlight the importance of the parental alienation syndrome through the Legal Science approach. Approached aspects: 1. concept; 2 determinant causes of the alienation process; 3. degree and extension of the alienation; 4. how to get parental alienation; 5. elements of identification of parental alienation; 6. consequences of the parental alienation; 7. judicial repression of parental alienation; 8. the role of the lawyer in parental alienation. Conclusions: to identify the parental alienation and prevent this harmful process from affecting the child and converting into a syndrome are tasks for the Justice. The family law lawyer must prioritize the child and adolescent, even when the alienating parents demand their rights, including the refusal to support the cause of the alienating parent.
Keywords: Neglected child. Laws. Ethics. Child.
Resumen
Objetivo: destacar la importancia del síndrome de alienación parental sobre enfoque de la Ciencia Jurídica. Aspectos abordados: 1. concepto; 2. causas determinantes del proceso de alienación; 3. grados y extensión de la alienación; 4. medios para obtener la alienación parental; 5. elementos de identificación de la alienación parental: 6. consequencias de la alienación parental; 7. la represión judicial a la alienación parental; 8. el papel del abogado delante de la alienación parental. Conclusiones: identificar la alienación parental y evitar que este maléfico proceso afecte al niño y se convierta en síndrome son tareas para el Poder Judicial. El abogado que milita en el área del derecho de família debe priorizar la defensa del niño, inclusive con la recusa al patrocínio de la causa del progenitor alienante.
Palabras clave: Maus tratos. Leyes. Ética. Niño.
1. Conceito
Uma vez consumada a separação do casal e outorgada a guarda dos filhos a um dos ex-consortes, assiste ao outro, como cediço, o direito-dever de com eles estar. É o chamado direito de visitas, o qual não compreende, ao contrário do que possa parecer, apenas o contato físico e a comunicação entre ambos, mas o direito de o progenitor privado da custódia participar do crescimento e da educação do menor. Trata-se de uma forma de assegurar a continuidade da convivência entre o filho e o genitor não-guardião, ou seja, do vínculo familiar, minimizando, assim, a desagregação imposta pela dissolução do casamento.
O regime de visitas estabelecido no acordo de separação ou determinado pelo juiz objetiva, desse modo, não apenas atender os interesses e as necessidades do genitor não-titular da guarda, mas principalmente aqueles referentes ao próprio menor. Por essa razão, o exercício do direito de visitas não pode ser embaraçado ou suprimido, a não ser que circunstâncias extremamente graves assim recomendem.
Lamentavelmente, e com maior freqüência do que se supõe, reiteradas barreiras são postas pelo guardião à realização das visitas. Como se demonstrará mais adiante, não são poucos os artifícios e manobras de que se vale o titular da guarda para obstaculizar os encontros do ex-cônjuge com o filho: doenças inexistentes, compromissos de última hora, etc. E o que é pior e mais grave: tais impedimentos vêm ditados por inconcebível egoísmo, fruto exclusivo da animosidade que ainda reina entre os ex-consortes, sendo certo que, sem qualquer pejo, em nome de tais espúrios sentimentos, a criança é transformada em instrumento de vingança.
Esquecem os genitores que a criança, desde o nascimento, tem direito ao afeto, à assistência moral e material e à educação1. E não é por outra razão que a Constituição Brasileira no art. 227 estabelece ser “dever da família (…) assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito (…) à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”2.
Pois bem, o ex-consorte – geralmente o detentor da custódia, que intenta afastar o filho do relacionamento com o outro genitor -, promove aquilo que se denomina alienação parental. Essa situação pode dar ensejo ao aparecimento de uma síndrome, a qual exsurge do apego excessivo e exclusivo da criança com relação a um dos genitores e do afastamento total do outro. Apresenta-se como o resultado da conjugação de técnicas e/ou processos que, consciente ou inconscientemente, são utilizados pelo genitor que pretende alienar a criança, a que se alia a pouca vontade da criança em estar com o genitor não-titular da guarda. Nos EUA, denomina-se “alienador ingênuo” (naive alienator) aquele que procura, inconscientemente, afastar o outro genitor do convívio com o filho.
A criança que padece do mal se nega terminante e obstinadamente a manter qualquer tipo de contato com um dos genitores, independentemente de qualquer razão ou motivo plausível3. Cuida-se, na verdade, de um sentimento de rejeição a um dos genitores, sempre incutido pelo outro genitor no infante, fato que, em um primeiro momento, leva o petiz a externar – sem justificativas e explicações plausíveis – apenas conceitos negativos sobre o progenitor do qual se intenta alienar e que evolui, com o tempo, para um completo e, via de regra, irreversível afastamento, não apenas do genitor alienado, como também de seus familiares e amigos.
Essa alienação pode perdurar anos seguidos, com gravíssimas conseqüências de ordem comportamental e psíquica, e geralmente só é superada quando o filho consegue alcançar certa independência do genitorguardião, o que lhe permite entrever a irrazoabilidade do distanciamento a que foi induzido.
A esse processo patológico dá-se o nome de síndrome de alienação parental, identificada em 1985 pelo professor de Psiquiatria Infantil da Universidade de Columbia (EUA), doutor Richard A. Gardener4. Do ponto de vista médico, relativamente à criança, a
síndrome é uma forma de abuso emocional5, punida nos EUA, segundo o Family Court Act, com a perda da guarda e a supressão do direito de visitas por parte do genitor responsável pela alienação6.

Àquele que busca arredar a presença do outro genitor da esfera de relacionamento com o filho outorga-se o nome de “progenitor alienante” e ao outro, de cujo contato se subtrai a criança, de “progenitor alienado”. Geralmente o papel de progenitor alienante cabe à mãe, e o de alienado, ao pai.
A síndrome da alienação parental não se confunde, portanto, com a mera alienação parental. Aquela geralmente é decorrente desta, ou seja, a alienação parental é o afastamento do filho de um dos genitores, provocado pelo outro, via de regra, o titular da custódia. A síndrome da alienação parental, por seu turno, diz respeito às seqüelas emocionais e comportamentais de que vem a padecer a criança vítima daquele alijamento. Assim, enquanto a síndrome refere-se à conduta do filho que se recusa terminante e obstinadamente a ter contato com um dos progenitores, que já sofre as mazelas oriundas daquele rompimento, a alienação parental relaciona-se com o processo desencadeado pelo progenitor que intenta arredar o outro genitor da vida do filho. Essa conduta alienante, quando ainda não deu lugar à instalação da síndrome, é reversível e permite – com o concurso de terapia e auxílio do Poder Judiciário – o restabelecimento das relações com o genitor preterido7. Já a síndrome, segundo as estatísticas divulgadas por Darnall, somente cede, durante a infância, em 5% dos casos7.
Essa patologia afeta mais os meninos, pois são os que mais sofrem com a ausência paterna, em idade que varia entre oito e 11 anos. Crianças mais velhas tendem a opor maior resistência à pressão do genitor alienante, já que têm um pouco mais de independência e de vontade própria8.
2. Causas determinantes do processo de alienação
Malgrado o objetivo da alienação seja sempre o mesmo – o banimento do outro genitor da vida do filho, as razões que levam o genitor alienante a promovê-la se denotam bastante diversificadas. Pode resultar das circunstâncias e/ou, de se tratar o genitor alienante de pessoa exclusivista, ou ainda, que assim procede motivado por um espírito de vingança ou de mera inveja.
Muitas vezes o afastamento da criança vem ditado pelo inconformismo do cônjuge com a separação; em outras situações, funda-se na insatisfação do genitor alienante, ora com as condições econômicas advindas do fim do vínculo conjugal, ora com as razões que conduziram ao desfazimento do matrimônio, principalmente quando este se dá em decorrência de adultério e, mais freqüentemente, quando o ex-cônjuge prossegue a relação com o parceiro da relação extra-matrimonial. Neste último caso, o alijamento dos filhos de um dos pais resulta de um sentimento de retaliação por parte do ex-cônjuge abandonado, que entrevê na criança o instrumento perfeito da mais acabada vindita. Pode suceder, também, que a exclusividade da posse dos filhos revele-se como conseqüência do desejo de não os ver partilhar da convivência com aqueles que vierem a se relacionar com o ex-cônjuge – independentemente de terem sido eles os responsáveis pelo rompimento do vínculo matrimonial. Em outra hipótese, não de rara ocorrência, a alienação promovida apresenta-se como mero resultado da posse exclusiva que o ex-cônjuge pretende ter sobre os filhos.
São situações que se repetem na prática, muito embora os motivos que as ditem mostrem natureza diversa: às vezes é a solidão a que se vê relegado o ex-cônjuge, especialmente quando não tem familiares próximos – isolamento que o leva a não prescindir da companhia dos filhos; outras vezes é a falta de confiança, fundada ou infundada, que o ex-cônjuge titular da guarda nutre pelo ex-consorte para cuidar dos filhos; outras vezes é a falta de confiança, fundada ou infundada, que o excônjuge titular da guarda nutre pelo ex-consorte para cuidar dos filhos. Em determinadas situações, a alienação representa mera conseqüência do desejo de o alienante deter, apenas para si, o amor do filho, algumas outras vezes resulta do ódio que o genitor alienante nutre pelo alienado, ou mesmo do simples fato de o alienante julgar o outro genitor indigno do amor da criança.
A depressão, de que pode padecer o progenitor alienante, também é apontada como motivadora da alienação parental, assim como a dificuldade de relacionamento entre os pais. Às vezes, até mesmo a diversidade de estilos de vida é tida como causa da alienação parental e, quando isso ocorre, tal se dá diante do receio que tem o alienante de que a criança possa adotar ou preferir aquele modus vivendi por ele não adotado.
Lamentavelmente, em alguns casos, o fator responsável pela alienação é o econômico: o genitor alienante objetiva obter maiores ganhos financeiros, ou mesmo outros benefícios afins, à custa do afastamento da criança do genitor alienado. Em circunstâncias como essas, se o genitor alienado resistir à chantagem, as portas para a síndrome estarão abertas9.
Quando provocada especificamente pelo pai, a alienação parental ora vem motivada pelo desejo de vingança pela separação, ou pelas causas que a determinaram (e.g. adultério), ora pela necessidade de continuar mantendo o controle sobre a família, e até mesmo para evitar o pagamento de pensão alimentícia.
A alienação parental – seja ela induzida pelo pai ou pela mãe e malgrado motivada por fatores diversos – produz os mesmos sintomas na criança e a afeta de igual modo10.
Todas essas circunstâncias, oriundas de atitude imatura e egoísta, acabam dando ensejo ao alijamento pretendido e, por conseqüência, à síndrome. Se, por um lado, logra o genitor alienante prejudicar o alienado, por outro, torna a criança vítima dessa situação. A partir daí, como veremos, as conseqüências para os filhos – ainda que a ruptura da convivência com o outro progenitor não seja absoluta – são as mais graves possíveis.
3. Graus e extensão da alienação
A alienação nem sempre é atingida em termos absolutos: às vezes a resistência do genitor alienado é de tal ordem que ainda consegue se avistar com os filhos – de modo forçado ou não – em casas de parentes, educandários ou até mesmo em visitários públicos. A alienação parental, no entanto, é, via de regra, alcançada pelo trabalho incansável de destruição da figura do progenitor alienado, promovida pelo progenitor alienante. Tal esforço conduz a situações extremas de alienação, que acabam por inviabilizar qualquer contato com o genitor definitivamente alienado11. Muitas vezes, a resistência oferecida pelos filhos ao relacionamento com um dos pais é tamanha, que a alienação parental acaba por contar, inclusive, com o beneplácito do Poder Judiciário. Não raro, diante dessa circunstância, alguns juízes chegam até mesmo a deferir a suspensão do regime de visitas. É o quanto basta para que se tenha a síndrome instalada em caráter definitivo.
Outro meio de manobra para excluir o outro genitor da vida do filho é a mudança de cidade, estado ou país. Geralmente essa transferência de domicílio se dá de modo abrupto, após anos de vida em local ao qual não apenas o genitor alienante encontrava-se acostumado e adaptado, como também a criança que, de inopino, vê-se privada do contato com o progenitor alienado, com os familiares, com os amiguinhos, com a escola a que já se encontrava integrada, etc. E tudo em nome de vagas escusas: melhores condições de trabalho ou de vida, novo relacionamento amoroso com pessoa residente em cidade diferente e, quase sempre, distante, etc. Nesses casos, adverte Gardner, o juiz deve se mostrar muito atento, para verificar quando se trata de mudança ditada por motivos reais e justificados ou quando ela não passa de subterfúgio para afastar o outro genitor do filho10,12.
Por fim, quando o genitor alienante não logra obter a alienação desejada, esta é alcançada pelo mais trágico dos meios: o assassinato do genitor que se pretende alienar, ou mesmo – o que é mais terrível – dos próprios filhos. É conhecido, em São Paulo, o caso de uma mulher que, inconformada com a perda do marido em decorrência da separação, assassinou os três filhos e, em seguida, suicidou-se. O homicídio e o suicídio perpetrados justificar-se-iam, consoante as palavras por ela deixadas, pelo fato de que, sem a sua presença, ninguém mais saberia cuidar de seus filhos. Daí, por não conseguir mais viver sem o marido,
de quem se separara, entendia ela que os filhos também não teriam condições de continuar vivendo. Foi por essa estapafúrdia e pífia razão que, antes de se suicidar, matara as três crianças. O caso representa, sem dúvida, o grau máximo em que se pode verificar a consumação da alienação parental.

4. Meios para obter a alienação parental
A alienação parental é obtida por meio de um trabalho incessante levado a efeito pelo genitor alienante, muitas vezes até mesmo de modo silencioso ou não explícito. Nem sempre é alcançada por meio de lavagens cerebrais ou discursos atentatórios à figura paterna. Na maior parte dos casos, o cônjuge titular da guarda, diante da injustificada resistência do filho em ir ao encontro do outro genitor, limita-se a não interferir, permitindo, desse modo, que a insensatez do petiz prevaleça.
É curioso observar que, em situações como essas, se indagado o menor acerca dos motivos pelos quais não deseja estar com o outro genitor, nenhuma explicação convincente é fornecida. Algumas vezes a justificativa resume-se no desagrado de comparecer a determinados lugares (casa dos avós, por exemplo); em outras oportunidades, a justificativa encontra amparo na não-participação do genitor em determinadas brincadeiras, ou mesmo no inconformismo com o cumprimento dos deveres escolares imposto pelo outro genitor.
Em outras circunstâncias, o genitor alienante opõe às visitas toda sorte de desculpas: estar a criança febril; acometida por dor de garganta; visitas inesperadas de familiares; festinhas na casa de amigos, etc. Também com freqüência, o genitor alienante vale-se de chantagem emocional para lograr a alienação parental: induz a criança à crença de que, se ela mantiver relacionamento com o genitor alienado, estar-lhe-á traindo, permitindo, desse modo, que ele, genitor alienante, permaneça só, abandonado e, portanto, infeliz.
5. Elementos de identificação da alienação parental
Tendo em vista o casuísmo das situações que levam à identificação da síndrome de alienação parental, a melhor forma de reconhecê-las encontra-se no padrão de conduta do genitor alienante, o qual se mostra caracterizado quando este, dentre outras atitudes: a) denigre a imagem da pessoa do outro genitor; b) organiza diversas atividades para o dia de visitas, de modo a torná-las desinteressantes ou mesmo inibí-las; c) não comunica ao outro genitor fatos importantes relacionados
à vida dos filhos (rendimento escolar, agendamento de consultas médicas, ocorrência de doenças, etc.) d) toma decisões importantes sobre a vida dos filhos, sem prévia consulta ao outro cônjuge (por exemplo: escolha ou mudança de escola, de pediatra, etc.); e) viaja e deixa os filhos com terceiros sem comunicar o outro genitor; f) apresenta o novo companheiro à criança como sendo seu novo pai ou mãe; g) faz comentários desairosos sobre presentes ou roupas compradas pelo outro genitor ou mesmo sobre o gênero do lazer que ele oferece ao filho; h) critica a competência profissional e a situação financeira do ex-cônjuge; i) obriga a criança a optar entre a mãe ou o pai, ameaçando-a das conseqüências, caso a escolha recaia sobre o outro genitor; j) transmite seu desagrado diante da manifestação de contentamento externada pela criança em estar com o outro genitor; k) controla excessivamente os horários de visita; l) recorda à criança, com insistência, motivos ou fatos ocorridos pelos quais deverá ficar aborrecida com o outro genitor; m) transforma a criança em espiã da vida do ex-cônjuge; n) sugere à criança que o outro genitor é pessoa perigosa; o) emite falsas imputações de abuso sexual, uso de drogas e álcool; p) dá em dobro ou triplo o número de presentes que a criança recebe do outro genitor; q) quebra, esconde ou cuida mal dos presentes que o genitor alienado dá ao filho; r) não autoriza que a criança leve para a casa do genitor alienado os brinquedos e as roupas de que mais gosta; s) ignora em encontros casuais, quando junto com o filho, a presença do outro progenitor, levando a criança a também desconhecê-la; t) não permite que a criança esteja com o progenitor alienado em ocasiões outras que não aquelas prévia e expressamente estipuladas12,13.

6. Conseqüências da alienação parental
Consumadas a alienação e a desistência do alienado de estar com os filhos, tem lugar a síndrome da alienação parental, sendo certo que as seqüelas de tal processo patológico comprometerão, definitivamente, o normal desenvolvimento da criança11,13. Gardner anota, a propósito, que, nesses casos, a ruptura do relacionamento entre a criança e o genitor alienado é de tal ordem, que a respectiva reconstrução, quando possível, demandará hiato de largos anos12.
A síndrome, uma vez instalada no menor, enseja que este, quando adulto, padeça de um grave complexo de culpa por ter sido cúmplice de uma grande injustiça contra o genitor alienado. Por outro lado, o genitor alienante passa a ter papel de principal e único modelo para a criança que, no futuro, tenderá a repetir o mesmo comportamento.
Os efeitos da síndrome podem se manifestar às perdas importantes – morte de pais, familiares próximos, amigos, etc. Como decorrência, a criança (ou o adulto) passa a revelar sintomas diversos: ora apresenta-se como portadora de doenças psicossomáticas, ora mostra-se ansiosa, deprimida, nervosa e, principalmente, agressiva. Os relatos acerca das conseqüências da síndrome da alienação parental abrangem ainda depressão crônica, transtornos de identidade, comportamento hostil, desorganização mental e, às vezes, suicídio. É escusado dizer que, como toda conduta inadequada, a tendência ao alcoolismo e ao uso de drogas também é apontada como conseqüência da síndrome.
Por essas razões, instilar a alienação parental em criança é considerado, pelos estudiosos do tema, como comportamento abusivo, tal como aqueles de natureza sexual ou física9-13. Em grande parte dos casos, a alienação parental não afeta apenas a pessoa do genitor alienado, mas também todos aqueles que o cercam: familiares, amigos, serviçais, etc., privando a criança do necessário e salutar convívio com todo um núcleo familiar e afetivo do qual faz parte e ao qual deveria permanecer
integrada.

7. A repressão judicial à alienação parental
Uma vez identificado o processo de alienação parental, é importante que o Poder Judiciário aborte seu desenvolvimento, impedindo, dessa forma, que a síndrome venha a se instalar. Via de regra, até por falta de adequada formação, os juízes de família fazem vistas grossas a situações que, se examinadas com um pouco mais de cautela, não se converteriam em exemplos do distúrbio ora analisado.
É imperioso que os juízes se dêem conta dos elementos identificadores da alienação parental, determinando, nesses casos, rigorosa perícia psicossocial, para então ordenar as medidas necessárias para a proteção do infante. Observe-se que não se cuida de exigir do magistrado – que não tem formação em Psicologia – o diagnóstico da alienação parental. No entanto, o que não se pode tolerar é que, diante da presença de seus elementos identificadores, não adote o julgador, com urgência máxima, as providências adequadas, dentre elas, o exame psicológico e psiquiátrico das partes envolvidas.
Uma vez apurado o intento do genitor alienante, insta ao magistrado determinar a adoção de medidas que permitam a aproximação da criança com o genitor alienado, impedindo, assim, que o progenitor alienante obtenha sucesso no procedimento já encetado.
As providências judiciais a serem adotadas dependerão do grau em que se encontra o estágio da alienação parental. Assim, poderá o juiz: a) ordenar a realização de terapia familiar14, nos casos em que o menor já apresente sinais de repulsa ao genitor alienado; b) determinar o cumprimento do regime de visitas estabelecido em favor do genitor alienado, valendo-se, se necessário, da medida de busca e apreensão; c) condenar o genitor alienante ao pagamento de multa diária, enquanto perdurar a resistência às visitas ou à prática que enseja a alienação; d) alterar a guarda do menor, principalmente quando o genitor alienante apresentar conduta que se possa reputar como patológica, determinando, ainda, a suspensão das visitas em favor do genitor alienante, ou que elas sejam realizadas de forma supervisionada15; e) dependendo da gravidade do padrão de comportamento do genitor alienante ou diante da resistência dele perante o cumprimento das visitas16, ordenar sua respectiva prisão.
Em relação à possível alteração da guarda, aventada anteriormente no item d, não se registra nos anais de nossa jurisprudência decisão de modificação de guarda ditada exclusivamente pelo impedimento aposto às visitas por parte do titular da custódia. Há um único e isolado julgado em que a alteração da custódia encontrava um de seus fundamentos em tal circunstância, mas a razão primeira da decisão foram os maus tratos
do guardião à filha menor14.

Muito embora, no Direito Brasileiro, a oposição e impedimento ao exercício do direito de visitas não seja considerada crime – ao contrário do que sucede em outros países, como explicitado abaixo, entre nós o apenamento pode vir alicerçado no descumprimento de ordem judicial, delito contemplado no art. 330 do Código Penal15.
No Código Penal da Noruega: “§ 216. Any person who causes or is accessory to causing a minor to be unlawfully deprived of or kept deprived of his parents’ or other authorized persons’ care shall be liable to imprisonment for a term not exceeding three years. If there are extenuating circumstances, fines may be imposed. A public prosecution will only be instituted when requested by an aggrieved person.”
No Código Penal da Califórnia: “278.5. (a) Every person who takes, entices away, keeps, withholds, or conceals a child and maliciously deprives a lawful custodian of a right to custody, or a person of a right to visitation, shall be punished by
imprisonment in a county jail not exceeding one year, a fine not exceeding one thousand dollars ($1,000), or both that fine and imprisonment, or by imprisonment in the state prison for 16 months, or two or three years, a fine not exceeding ten thousand dollars ($10,000), or both that fine and imprisonment. (b) Nothing contained in this section limits the court’s contempt power. (c) A custody order obtained after the taking, enticing away, keeping, withholding, or concealing of a child does not constitute a defense to a crime charged under this section.”
No Código Penal da Alemanha: “235. Sustracción de menores de edad (1) Con pena de privación de la libertad hasta cinco años o con multa será castigado: 1. quién sustraiga o retenga a una persona menor de 18 años con violencia a través de amenaza con un mal considerable o por medio de astucia, 2. quién sustraiga o retenga a un niño sin ser su familiar de sus padres, de un padre progenitor, del su tutor o de su curador. (2) De igual manera será castigado quién 1. sustraiga un menor a los padres, a sus padres a uno de los padres progenitores, al tutor o al curador con el fin de llevarlo al extranjero, o 2. retenga un niño menor de sus padres, de uno de sus padres progenitores, del tutor o del curador, en el extranjero después de haber sido llevado allá o se haya trasladado allá. (3) En los casos del inciso 1 numeral 2 y del inciso 2 numeral 1, la tentativa es punible. (4) Se impondrá pena privativa de la libertad de uno a diez años cuando el autor: 1. conduzca a la víctima por el hecho a peligro de muerte o de un grave perjuicio de salud o a un perjuicio considerable para su desarrollo físico o psíquico, o 2. cometa el hecho con ánimo de lucro o con el propósito de enriquecerse a si o a un tercero (5) Si el autor por el hecho causa la muerte de la víctima, entonces el castigo es pena privativa de la libertad no inferior a tres años. (6) En casos menos graves del inciso 4 se impondrá pena privativa de la libertad de 6 meses hasta cinco años; en casos menos graves del inciso 5 la pena privativa de la libertad es de uno hasta diez años.”
Código Penal Francês: “Article 227-5 Le fait de refuser indûment de représenter un enfant mineur à la personne qui a le droit de le réclamer est puni d’un an d’emprisonnement et de 15.000 euros d’amende.”

8. O papel do advogado diante da alienação parental
Identificar
a alienação parental e evitar que esse maléfico processo afete a criança e se converta em síndrome são tarefas que se impõem ao Poder Judiciário, que, para esse fim, deverá contar com o concurso de assistentes sociais e, principalmente, de psicólogos. Por sua vez, ao advogado que milita na área do direito de família, quando procurado pelo genitor alienante para a defesa de seus direitos, tarefa de menor dificuldade e importância não lhe é destinada.
Quando está patente o processo de alienação parental, promovido pelo progenitor alienante, não se permite aos advogados, em nome de uma suposta defesa de seus direitos, prejudicar aquele que é, em tais casos, o interesse maior a ser protegido: o do menor. Em tais situações, a recusa ao patrocínio da causa do progenitor alienante impõe-se, também por força do comando constitucional que erige à condição de dever da sociedade – e, por conseguinte, de todo e qualquer cidadão, assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à convivência familiar2.





Referências
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Constituição da República do Brasil, art. 227, p. 148, 1988.
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Gardner R. Family therapy of the moderate type of parental alienation syndrome. Addendum I to 2nd ed. June 1999. p.1.
Lowenstein F. Parental alienation syndrome: a two step approach toward a solution. Contemporary Family Therapy 1998;20:505-20.
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Ap. Cível nº 598.242.972, 8ª. CC, Rel. Dês. Alzir Felippe Schmitz, j. Ação cautelar inominada. Pedido de entrega de declaração de nascimento pelo hospital onde se deu o parto. Art. 228 do ECA. 13/4/2000.
Código Penal Brasileiro, art. 330.
Dra. Priscila Maria Pereira Corrêa da Fonseca
Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade Paulista de Direito da Pontifícia Universidade Católica, Doutora em Direito Processual Civil pela Universidade de São Paulo e Professora de Direito Comercial na Faculdade de Direito da USP
Publicado originalmente em: Pedriatria (São Paulo) 2006;28(3)162-8
Endereço para correspondência com a autora:
Avenida Major Sylvio de Magalhães Padilha, 5.200, Ed. Quebec, cjto. 401 São Paulo/ SP.
Cep 05677-000
E-mail: priscilafonseca@uol.com.br

CRIANÇA OBJETO?











Rio de Janeiro 24 junho 2008

“Gosto do papai e da mamãe. Não queria que eles brigassem tanto. Preferia que eles morassem juntos comigo. Acho que por isso eu minto tanto.” Entrevista com um menino de oito anos, cuja posse e guarda estava sendo disputado judicialmente pelos pais.
As experiências vividas no Hospital Souza Aguiar me ensinavam a lutar contra o imobilismo, a transformar, a enfrentar, constantes desafios. Publicávamos trabalhos científicos, preparávamos congressos, fazíamos palestras e conferências, organizávamos cursos com grande sucesso. Por intermédio da mídia sensibilizávamos e informávamos a população e mobilizávamos muitas pessoas para a nossa causa: a garantia dos direitos de crianças, adolescentes e suas famílias.
Em pouco tempo, meu nome já era conhecido não só como pediatra, mas sobretudo como homem público. E eu assumia essa postura, vencendo a minha timidez natural.
Estava ficando acostumado, sem me surpreender mais, a me envolver em muitas áreas polêmicas, seguindo a meta de atender com qualidade e defender os direitos de crianças e adolescentes. Novos desafios já não me assustavam. Até um dia que recebi um telefonema especial. Era Rudi Loewenkron, da Quarta Vara da Família do Rio de Janeiro. Atendi o telefone e fiquei perplexo. Ouvi o juiz que, calmamente, disse:
- Tenho de decidir uma situação muito complexa de visitas, posse e guarda de uma criança cujos os pais estão separado litigiosamente. Eles têm excelentes advogados defendendo seus interesses, mas a criança, não. Está dividida entre os pais. Preciso de um advogado para ela e, por isso, gostaria de um laudo pericial seu.
- Mas não sou advogado. Muito menos trabalho com as leis. Como posso ser um perito?- indaguei, confuso.
- Eu mando um laudo elaborado por um perito experiente para você ler. Veja como ele faz. Pode servir de roteiro. Você tem muito conhecimento de crianças, adolescentes e suas famílias para desenvolver esse trabalho. Não é nada que você não possa fazer. Você poderá, com seu laudo, me auxiliar a emitir uma sentença justa, que atenda o interesse maior das crianças – tranqüilizava ele. Ou me assustava mais, não sei.
De acordo com o Dicionário Aurélio, perito “é aquele que é sabedor ou especialista de determinado assunto”. Realmente, devido a meu trabalho de anos junto a crianças, adolescentes e suas respectivas famílias, do assunto eu entendia. Afinal, há muito vinha desenvolvendo ao indispensável enfoque multiprofissional do desenvolvimento integral da criança e do adolescente.
O Código de Processo Civil estabelece que o perito de um processo é escolha pessoal do Juízo e deve ser idôneo e com formação na questão objeto da ação.
Quando iniciei minha primeira perícia, nomeando pelo juiz Rudi Loewenkron, não imaginava que estaria mergulhado em um amplo trabalho que me proporcionaria profundos conhecimentos sobre crianças e suas famílias. O trabalho de perícia é lento, de grande compromisso, por vezes muito sofrido, mas me proporcionou grandes experiências nos anos em que a ele me dediquei.
Aceitei o desafio. Estava consciente da minha nova responsabilidade em emitir um parecer que iria colaborar com uma decisão importante, envolvendo o peso das fortes emoções de uma família desfeita e o futuro de uma criança.
Sabia que teria um trabalho árduo pela frente e que ele seria demorado. Como tudo na área pediátrica, exigiria de mim muita empatia, um profundo envolvimento com a criança e a família, todos em sofrimento. E, finalmente, deveria elaborar um laudo com total isenção.
A partir do modelo fornecido para minha orientação, criei uma metodologia própria de trabalho para apresentar um laudo mais profundo, mais abrangente e muito claro. Tinha de ouvir, no mínimo, o pai e a mãe em separado; a criança, também, só e com cada um dos pais, e sempre acompanhando todos os diálogos, olhares, emoções. Além dessas entrevistas em meu consultório, iria visitar, com a criança, os ambientes onde estavam vivendo sem pai, sua mãe e alguns parentes, como os avós.
Teria de entrevistar também os eventuais novos parceiros doa pais, para sentir como eles e a criança se portavam, quando juntos.

Comecei meu trabalho, minha primeira perícia, mergulhando no drama de uma família em conflito.
Foram longos e exaustivos encontros que mantivemos, mas qualquer dúvida tinha de ser desfeita antes de eu dar meu parecer.
A mãe alegava que não queria entregar a filha para o pai, nos dias de visitas, porque ele vinha sempre acompanhado de “uma mulher”, e não tinha onde ir com a menina, optando por levá-la a um shopping, de moto, ou para a casa da mãe dele, que seria cheia de móveis velhos, poeira e mofo, que por sua vez causava asma na criança. Fui conhecer o apartamento da avó. Era enorme, belíssimo, realmente com muitos estofados e cortinas. Mas, esse não era um problema grava, já que a avó se predispunha a refazer a decoração para não prejudicar as visitas da neta, que ela adorava. Havia na verdade uma situação de grande beligerância, de conflitos não resolvidos, entre os pais.
Logo vim a perceber que, à medida que um casal separado vai se acomodando, arranjando novos parceiros, as desavenças diminuem. O casamento, na realidade, muitas vezes é desfeito legal e socialmente, mas permanecem vivas, concretas, as diferenças, a agressividade mútua. Parece que o casamento continua, só que agora com a interveniência de advogados e juízes. Quando ambos refazem suas vidas, profissional e afetiva, tudo se acalma e a relação desfeita judicialmente, se efetiva finalmente.
Na realidade, todas as brigas e disputas já ocorriam durante o casamento e continuavam da mesma maneira, após a separação judicial. Eu via claramente um casamento que continuava – no que ele teve de pior.
Em geral, os motivos que levam a brigas envolvendo posse e guarda e regulamentação de visitas são geradas não em razão do interesse dos pais pelos filhos, mais por conta de ciúmes, inveja, competição, sem falar na questão financeira, quando a mãe, freqüentemente, exige uma pensão que o pai se nega a pagar – ou não tem realmente condições de assumir.
Eu me pergunto: ” E a criança, onde fica, se em princípio gosta do pai e da mãe? Gostaria de vê-los juntos, sem brigas”.
Voltam à minha mente as reflexões e as constatações de Elizabeth Badinter, em Um amor conquistado – O mito do amor materno. Será que essas mães gostam mesmo de seus filhos, fazendo deles os peões de uma guerra, de suas frustrações? E o pai, que nessas disputas em que o grande perdedor é a criança, tendendo a variar ente a omissão, o desinteresse pelos filhos e o autoritarismo e a agressividade?
Durante a realização de perícias, constatei como é importante o envolvimento profundo de perito – da mesma forma que o pediatra – com a criança.
As crianças, mesmo ainda muito pequenas, depois de três ou quatro anos de idade, contam, às vezes com extrema lucidez, o que realmente está acontecendo. Mas é necessário ficar sempre atento. Porque o que dizem muitas vezes não reflete seus verdadeiros sentimentos, mas pressões de quem detém a sua posse e guarda, que os induzem a darem informações falsas ou exageradas – as crianças estão sendo usadas pelos pais para se ferirem mutuamente.
Nas polêmicas, os pais se acusam de tudo: de práticas homossexuais, de participarem de bacanais e orgias, de uso de drogas, atos ilícitos, alcoolismo, agressões contra a família, maucaratismo e até de abuso sexual contra os próprios filhos.
Ouvindo todas as acusações, sempre fico perplexo, imaginando como essas pessoas que se agridem tanto um dia se amaram, se escolheram. Como conseguiram conviver, ter filhos?
As dúvidas do perito são enormes. Será que houve realmente o fato narrado? E se a mãe for realmente, como o marido a acusa, uma adúltera, não deve, por isso, ficar com os filhos? E o marido, participaria mesmo de orgias, ou abusaria sexualmente de um filho?
No caso de ter optado pelo homossexualismo, deixa de ser bom pai?
Vi situações incríveis, como, por exemplo, marcas constatadas de violências no corpo, fraudadas, forjadas, auto-infringidas pela própria vítima, para acusar o ex-cônjuge e impressionar o juiz.
Procurei sempre respostas concretas para essas dúvidas para poder opinar e ajudar na decisão do juiz.
Mesmo assim também fui enganado. Certa vez fui nomeado perito em um processo de separação de um casal vindo de Salvador. Os três filhos moravam com o pai, até que a mãe resolveu se mudar para o Rio de Janeiro, onde se estabeleceu com seu novo marido e pediu a guarda definitiva das crianças que trouxera consigo.
O pai, apaixonado pelas crianças, tentou uma transferência em seu trabalho. Não conseguindo, decidiu-se, obteve uma licenças, deixou Salvador e foi morar no Rio de Janeiro, perto dos filhos.
Observei que o pai era carinhoso, cuidadoso e atento com seus filhos. A mãe me apresentou o padrasto dos filhos, um homem de classe média, de bom trato, que se relacionava muito bem com os enteados. Na casa da mãe, com quem viviam, o ambiente era apropriado e as coisas bem cuidadas.
Ao final, eu estava encantado com os cuidados que os meninos recebiam do padrasto. A ligação afetiva das crianças com os pais também era muito forte. O pai estava tranqüilo, acompanhando o desenvolvimento diário dos meninos. Não havia, na verdade, motivo para retirar a posse e guarda da mãe.
Em meu laudo, fiz questão de elogiar e parabenizar os pais, sua ligação com os filhos, o padrasto carinhoso – confirmando que as crianças estavam saudáveis, estudando em bom colégio. Conclui, afirmando que as coisas estavam muito bem arranjadas e que os filhos podiam perfeitamente ficar com a mãe.
Algum tempo depois de dar a sentença, o juiz me chama:
- Fomos ludibriados. Assim que a sentença foi proferida, a mãe pegou seus filhos e voltou para Salvador. O apartamento do Rio era emprestado e o novo marido falso. Tudo simulado para ela ganhar a causa…
Soubemos, pouco tempo depois dessa farsa, que a mãe decidiu devolver os filhos ao pai pra, então, passar a morar sozinha.
O que os pais não levam em conta é o que os filhos sentem diante dos embates judiciais que os envolvem. Afinal, a separação do casal é uma situação de perda para todos, mas acima de tudo para os filhos, crianças e adolescentes.
Alguns adultos aceitam melhor a nova situação, têm melhor estrutura emocional e econômica que lhes possibilita refazer-se como mais facilidade. Outros sofrem demais e por muito tempo. As repercussões sobre os filhos vão depender de uma série de fatores, inerentes à dinâmica familiar e à estabilidade emocional dos pais e da própria criança.
Os filhos, dependentes e indefesos, sem maturidade para superar suas perdas, ainda acabam se tornando o centro dos litígios. E muitas vezes são usados em atos de extrema violência psicológica, habilmente preparados por competentes e insensíveis advogados, diante de uma justiça que se mantém cega, desde que os argumentos usados pelas partes sejam legais e convincentes.
Este foi o caso de uma menina de oito anos de idade, que estudava no bairro de Botafogo, no Rio. Os pais, separados, brigavam fazia três anos. A menina, com freqüência, recusava-se a sair com pai no dia marcado pela Justiça. Ele alegava que a menina agia assim por influência da mãe. Por isso, seu advogado entrou com uma mandado de busca e apreensão, que lhe foi concedido.
Humilhada, a menina, diante dos colegas e professores, foi retirada da sala de aula do colégio onde estudava por um oficial de justiça e alguns policiais – como se fosse um mero objetivo.
Neste momento, a incompreensão, o egoísmo, a vaidade e a total falta de respeito aos direitos da criança atingiram o clímax. Na verdade, a menina já estava vivendo uma situação muito conflitante, com os adultos colocando-a na obrigação de tomar decisões e assumir posturas para os quais ela não tinha idade nem maturidade. Apenas fantasiava, como acontece com quase todos os filhos de pais separados, a situação ideal de seus pais vivendo juntos.
Acompanhei outro caso, de um garoto de três anos cujos pais, quando ele nasceu, já estavam separados havia seis meses. Tinha sido então acertado que a mãe teria a posse e guarda do bebê e o pai ficaria todos os finais de semana com ele. Quando completou dois anos, o menino passou a não querer acompanhar o pai nos dias previamente combinados. Este, extremamente inábil, apelou para medidas violentas, agressivas e intempestivas para forçar o filho sair com ele. Por mais de uma vez, quis retirar o menino utilizando a presença de policiais, aos quais alegava que a mãe se negava a cumprir o acordo judicial. Nas poucas vezes em que o pai conseguia levá-lo, o filho voltava triste, apático, chorando à toa, sem falar e acordando à noite aos gritos, com pavor noturno.
A mãe, para preservar a saúde mental do filho, requereu a concessão de uma liminar, suspendendo a visitação do pai e uma modificação de cláusula de visita, para que o pai só pudesse ver a criança na residência e na presença dela, até que a situação fosse superada. O pai não aceitou e voltou a entrar com o recurso de busca e apreensão do filho. Resultado: aos três anos, apesar de fisicamente saudável, o garoto ainda não controlava os esfíncteres, evacuando e urinando em qualquer lugar, tendo de dormir de fralda todas as noites. Mostrava-se totalmente inseguro e assustado.
É lamentável que tudo isso ocorra. Medidas violentas, além de infrutíferas, são prejudiciais ao desenvolvimento de criança.
Seria fundamental que casais que se separam tivessem em mente que a presença e o convívio de um filho com ambos é extremamente importante para a sua formação psicossocial. A mãe, que geralmente tem a posse e guarda, deve preservar a imagem paterna, facilitando a sua aceitação pela criança, enquanto o pai deve conquistar o filho com paciência e habilidade, levando em conta e entendendo a forte e indispensável ligação mãe-filho nos primeiros anos da vida de qualquer criança.

No entanto, esse caso em que os pais recorrem à Justiça, às vezes em causas que se arrastam por anos, para estranhos decidiram sobre seus problemas familiares e emocionais, que caberiam a eles enfrentar com desprendimento e bom senso, resultam em duras conseqüências negativas para o desenvolvimento psicológico dos filhos.
Durante as entrevistas necessárias à elaboração do laudo pericial, percebe-se de imediato o sofrimento das crianças. Elas ficam divididas, não querendo ferir nenhum dos pais, mesmo quando instado por eles a tomar partido. É comum que tenham o comportamento regredido, com dificuldade de aprendizagem, somatizando suas angústias através de quadros de asma, inapetência, obesidade, vômito e diarréia.
As conversas com essas crianças são tristes, emocionantes. Eu até hoje me sensibilizo quando recordo o relato de menino de nove anos, numa entrevista em meu consultório. Ele vivia em um apartamento, em um condomínio residencial de classe média alta, na Barra da Tijuca, Rio. Morava com a mãe e seu novo marido. O casal já tinha outro filho e viviam todos em total harmonia. O pai desse adolescente, contudo, era irresponsável aos sentimentos de seu filho.
Sua mãe, na tentativa de manter uma boa imagem do pai, forçava que ele saísse com o menino em alguns finais de semana. Num deles, um domingo, mãe, padrasto e família saíram, logo cedo, para um passeio. O garoto não foi, já que seu pai deveria chegar às 9h para pegá-lo. O pai não apareceu – e não era a primeira vez que isso acontecia.
No final da tarde, quando a família voltou, o menino estava exausto, sentado no meio fio, adormecido, ainda esperando pelo pai. Os resultados de seus conflitos eram há algum tempo visíveis. Nessa idade, ele, somatizando sua dor e angústia, ainda não controlava o esfíncter anal. Apresentava uma encoprese de difícil solução, que levava a mãe a lavar suas cuecas que ele sujava com pequenas quantidades de fezes líquidas, involuntariamente, durante o dia.
Guardo até hoje os desenhos que essa criança fez para mim enquanto conversávamos em meu consultório, mostrando como estava, enquanto esperava o pai, sentado no meio fio, com o corpo inclinado adormecido.
Mas novos processos continuavam a aparecer. Para exercer com precisão meu trabalho como perito eu tinha de ler os enormes volumes que formava cada um deles. Ficava impressionado com as filigranas jurídicas criadas. Como o de um casal que se separou quando o filho tinha quatro anos de idade. O menino apresentava distúrbio neuromotor primário, associado a dificuldade emocionais e distúrbios do aprendizado.
Quando o filho completou sete anos, o pai pediu sua posse e guarda, alegando que a pensão, considerada alta, não estava sendo bem usada pela mãe, e que ele tinha muitas outras despesas com a nova família que formara.
O advogado do pai, na busca de fatos que pudessem ser usados para acusar a mãe e ganhar a ação, usou como argumento maior o fato de a mãe se ocupar “com um verdadeiro zoológico que instalou em casa”, que dificultaria até a locomoção do menino. Eram cinco cães, um galo, papagaio, dois micos diversos pássaros e galinhas poedeiras, descrevia ele nos autos. E concluía, ironizando nas entrelinhas, que a “presença de um menino de temperamento agito deve ser um desconforto para suaves animais emplumados e implumes, que constituem a alegria maior da mãe”.
Ao perito, o advogado questionava: ” queria o senhor perito informar se o convivência do menor com vários animais domésticos, na situação em que se encontra, é favorável ao tratamento”. A este quesito, respondi incisivo:”Crê este perito que o menino apresenta problemas sérios de saúde, que transcendem o questionamento em torno da presença ou não de animais domésticos”.
Apesar dos aspectos jocosos destas argumentações – e contra minha opinião – o pai ganha o processo e reverteu em seu benefício a posse e guarda do filho. Meses depois, desistiu e devolveu a criança à mãe.
Casos e descasos
Um processo que teve um desfecho estranho para mim foi o de um pai que, separado, mudou-se para outro estado, deixando seus três filhos – um menino de nove anos e duas meninas, uma com seis anos e a outra com sete – com a ex-mulher, no Rio de Janeiro. A mulher, com dificuldades financeiras, vivia modestamente em um apartamento pequeno, onde moravam também sua mãe e uma irmã. O pai das crianças estava bem e sabia que o filho mais velho, apesar de idealizar os pais juntos e amar muito a mãe, aceitava a idéia de ir morar com ele. Seria, inclusive, um forma saudável de o casal dividir a responsabilidade e os ônus de criar os filhos, segundo avaliei.
Como perito, meu laudo foi favorável a atender a pretensão do pai de receber a guarda do menino. A Justiça, no entanto, por entender que os irmãos não podem se separados e que dificuldades financeiras não justificam uma exceção, opôs-se, parecendo-me realmente cega, cumprindo burocraticamente o que diz a Lei, sem, mostrar qualquer sinal de bom senso e humanidade e, sobretudo, sem atender o interesse maior da criança.
Outro tipo de processo de posse e guarda muito comum é aquele indicado por avós que não suportam a convivência dos seus filhos com os respectivos cônjuges, interferindo na vida do casal, freqüentemente imaturo e influenciável. Esses avós, em geral, custeiam as despesas dos processos de separação, inclusive custos da perícia, porque os filhos não podem arcar com as despesas.
Atuei como perito em um caso desses, em que uma menina de três anos e meio vivia com os avós, que pretendiam a posse definitiva da neta. A insegurança e a imaturidade destes jovens pais, aliadas a um padrão irregular de vida para os critérios da atual sociedade, facilitaram a esses avós a conquista da posse e guarda definitiva da neta.
Um processo curioso foi de uma mãe que pedia a adoção de sua filha do primeiro casamento, então com quase nove anos, pelo segundo marido, com quem tinha mais dois filhos. Ela afirmava que o pai estava preso fora do Brasil por tráfico de drogas e que havia sete anos não via a família. A adoção foi concedida. Mas a menina, apesar de se sentir abandonado pelo pai, como afirmou em entrevistas que me deu, ainda tinha recordações afetuosas dele e da família paterna e pretendia reencontrá-los.
Mas os casos se sucedem, repetitivamente, na Justiça. Uma situação difícil de trabalho foi a de um menino cujos os pais não podiam se ver. Quando se encontravam, as agressões verbais entre is dois eram sempre muito virulentas. Em razão disso, ficou decidido que o pai pegaria o menino no tribunal, diante do juiz, a cada visita. E deveria devolver a criança no mesmo local.
Em pouco tempo, o filho passou a se negar a ver o pai. Com pedidos de busca e apreensão, o pai tentava forçar os encontros nos dias marcados.
Recebi pais e filhos no consultório, para tentar entender melhor a situação. O garoto mostrou-se dócil com o pai, quando se encontraram na minha presença. O mesmo comportamento tinha coma mãe.
Pai e mãe, separadamente, também eram carinhosos com o filho. A mãe, para o filho, valorizava a figura do pai. Aparentemente, não havia justificativa para o menino não aceitar as visitas.
Mais de uma vez, porém, tentei falar com os três, em conjunto, mas não consegui. Bastava o casal se encontrar e as brigas recomeçavam. Mesmo no meu consultório era impossível mantê-lo no mesmo ambiente.
Solicitei que a família inteira fizesse um tratamento psicológico pare vencerem a agressividade e, particularmente ao pai, pedi que se esforçasse por entender seu filho que, na insegurança, se apegaria muito à mãe, situação que facilmente seria transformada quando os dois parassem de se agredir. Até que todos estivessem bem, meu conselho, em beneficio da saúde do filho, foi que o pai continuasse a transmitir seu afeto por meio de telefonemas e correspondência, sem forçar os encontros com o menino.
Perdas e danos
A separação é sempre um momento doloroso para toda a família. Contudo, apesar das perdas que estão vivendo, os pais devem ficar atentos e fazer tudo para não prejudicar o desenvolvimento de seus filhos. Não é o que ocorre na maioria das separações litigiosas que chegam à Justiça.
Um caso típico foi o de uma menina, cujos pais estavam separados. Ela estava vivendo com a mãe. Aos oito anos, em suas entrevistas comigo, usava frases próprias de adultos, como “A vida dele não andou para frente…”,”Imagine que ele teve a petulância de me dizer que…”, “Fiquei traumatizada quando soube que…”, ou “Ele me dá só dez por cento do que ganha”.
Típicas frases repetidas por pressão da mãe. A menina estava bem no colégio, fisicamente normal, mas precocemente adultizada e participando intensamente das brigas e disputas dos pais.
Um processo que me deixou perplexo foi o que envolvia uma casal em que os pai e mãe eram bem-sucedidos profissionalmente.
Depois de brigas e reconciliações, partiram para um processo de separação coberto de mútuas acusações e envolvimentos sérias intrigas dos dois lados. Ambos pretendiam a posse e guarda do filho, então com oito anos de idade.
Inseguro, o menino ouvia as intrigas. Para manter a confiança do pai e da mãe, criou um jogo, levando e trazendo informações. Sentia-se fortalecido. Ele centralizava as atenções de todos, contando o que ouvia. Narrava detalhadamente para o pai o que se falava na casa da mãe. E vice-versa. Quando podia, e isto eu mesmo constatei diversas vezes nas entrevistas, inventava fatos, agravando o litígio das famílias do pai e da mãe.
Fiquei impressionado como um garoto de oito anos aprendera a manipular toda a dinâmica da família para se manter como foco das atenções. Eu me preocupava com seu futuro, com a forma como ele estava moldando seu caráter, depois de vê-lo constantemente tentar resolver seus problemas por meio de intrigas e da maledicência. O aprendizado desse tipo de comportamento poderia até levá-lo ao sucesso profissional, mas às custas de valores éticos e morais.
Temendo isso tudo, em minhas conclusões, eu alertava: “do ponto de vista da dinâmica familiar, e visando ao bom desenvolvimento do menino, este perito considera indispensável que os pais e o filho iniciem uma terapia familiar, não para uma reconciliação, mas sim uma definição clara de como procederem para causar menos mal à criança”.
Só fiquei tranqüilo depois de expressar esse conselho no laudo final que entreguei ao juiz. Tinha, conscientemente, cumprido minha missão – como perito e com pediatra.
Afeto é o que importa
Lembro o depoimento de um menino de oito anos, falante, engraçado, saudável fisicamente, dando-se otimamente com seus colegas de escola e amigos do clube e relacionando-se maravilhosamente bem com os pais, separados – que estavam vivendo uma fase de litígio violento pela posse e guarda do garoto.
Um dia, a sós comigo em meu consultório, confiando no afeto e segurança que eu lhe transmitia, tenso e ansioso, confessou:
- Gosto do papai e da mamãe. Não queria que eles brigassem tanto, preferia que eles vivessem bem e morassem juntos comigo. Acho que é por isso que eu minto tanto.
Ao examinar os autos nos diversos processos dos quais participei como perito, fiquei sempre espantado com a violência das acusações mútuas que se faziam os pais.
Em muito processos, ficava patente a violência psicológica de pais contra filhos,às vezes com o aval da Justiça, como nos casos de mandados de busca e apreensão.
No meio dos conflitos, dependentes da habilidade de advogados e das decisões judiciais, crianças inocentes, idealizando seus pais, vivendo em harmonia.
Torço sempre para que esses filhos não tenham nunca acesso a esses processos, testemunhos e egoísmos e do descontrole emocional dos seus pais.
É triste e deprimente constatar a que ponto podem chegar pais e alguns advogados para resolverem suas questões, sem levar em conta o uso que fazem de uma criança.
Experiência global
É extremamente enriquecedora para um pediatra a experiência de trabalhar como um perito do Juízo, em varas de família.
Apesar de precisar usar de total empatia com todos os envolvidos nos litígios e de muitas vezes chegar às lagrimas enquanto ouvia depoimentos sofridos, sempre mantive minha postura de advogado de crianças, que invariavelmente se tornam o pivô das desavenças dos adultos.
Freqüentemente, essas crianças demonstravam um lamentável envolvimento ambivalente com a situação que vivenciam na briga dos adultos.
Um caso típico, que recordo sempre com muita preocupação, foi o de um garoto de cinco anos, filho de pais de classe média alta. Ele apresentava bom desenvolvimento físico, tinha personalidade forte, era perspicaz e muito inteligente, mas estava dividido, com sentimento conflituosos e confusos em relação às atitudes dos pais.
Ele morava com a mãe, que o mimava muito, tinha um quarto só para brincar, outro, o seu, também cheio de brinquedos, mas dormia na cama da mãe. Ela era uma mulher bonita, vaidosíssima, distribuindo pela casa inúmeras fotos dela e do filho único. O garoto sentia-se o homenzinho, o substituto do papai que fora embora. A típica criança superprotegida pela mãe, afastando-se do pai que, por sua vez, forçava os encontros que a mãe tornava impossível.
O pai iniciou um processo contra a mãe, pretendendo a posse e guarda.
Numa entrevista comigo, a sós, o garoto demonstrou, bem caracterizada, a influência da mãe quando se referia ao pai e sua nova mulher, que já tinha dois filhos de outro casamento. E toda sua ambivalência:
- Vim aqui para falar – iniciou, entrando em meu consultório.
- O quê? – indaguei.
- O que papai fez comigo. Não quero mais ir na casa dele.
- Você não gosta dele?
- Gosto, mas não quero ir na casa dele – respondeu, incisivo.
- Por quê?
- Porque papai tem uma amante.
- O que é uma amante – perguntei, com ar curioso.
- É uma mulher maluca… E mamãe me dá coisas, o papai não.
Na entrevista seguinte, desta vez ao lado da mãe que queria visivelmente me envolver a seu favor, o diálogo dos dois correu tenso:
- Conta para o doutor o que você me falou – iniciou a mãe.
- É, não gosto de dormir lá porque o papai me deixa sozinho e sai.
- Todas as vezes? – pergunta a mãe, conduzindoaconversa.
- Todas.
- Diz para o doutor, meu filho, que ele deixa a porta do quarto aberta enquanto dorme com a namorada… O quarto tem grade?
- Não, e fica no segundo andar – respondeu o menino.
- Seu pai conta historinhas para você, como a mamãe? – continua ela.
- Conta, mas de livro.
- E os remédios, quem dá pra você? – provoca.
- A mamãe.
- E o papai?
- Me deixa pegar chuva e dá os remédios na hora errada.
No encontro com o pai, ele se mostrou confuso. Mas estava relativamente seguro e arredio às demonstrações de afetividade exagerada, artificial e por vezes até forçada pelo pai, que o cobria de beijos e abraços. O menino, porém, não demonstrava qualquer antagonismo que pudesse impedir um convívio saudável com o pai.
Em meu laudo, indiquei tratamento para os pais, chamando a atenção para a relação sedutora da mãe e a postura autoritária do pai. Lembrava ao pai para não tentar encontros pela força, uma vez que conviver com ambos os pais é um dos mais saudáveis direitos da criança. À mãe, aconselhava que deixasse de jogar o filho contra a nova família do ex-marido, para que o menino pudesse ter um desenvolvimento psicossocial sem mais comprometimentos emocionais.
Ao longo dos anos em que trabalhei como perito indicado por juízes de varas de família, assisti a um desfile de situações com seres humanos em grande sofrimento. A luta na Justiça fazia parte de um batalha que se iniciaria muito tempo antes.
Senti, em todos os casos, crianças sendo usadas em um jogo de gente grande, que elas não sabem e nem querem jogar.
Exemplo disso é o dialogo que tive com uma menina de cinco anos, em visita que fiz ao apartamento no qual morava com a mãe e os avós.
- Como é seu pai ?
- É um chato, bobo, mau, nunca me dá nada de presente. Tomara que ele morra.
Em seguida, sem perceber a contradição, abriu o armário, pegou um perfume, passou no pescoço e disse para mim, vaidosa e despreocupada:
- Foi meu pai que me deu.
Nas perícias de que participei, vi, com alegria, alguns juízes, como Rudi Leowenkron, Jaime Abreu e Conceição Mousnier, e alguns advogados, se preocuparem realmente com as crianças, durante os litígios. E vi decisões que efetivamente levaram em conta o interesse maior da criança. Infelizmente, nem sempre isso ocorre.
Lauro Monteiro
Editor

sexta-feira, 20 de julho de 2012

VINGANÇA - É O MOTIVO?


A Alienação Parental funciona como um ímã negativo, que repulsa a presença de um dos pais  na relação com o filho. Normalmente, esse ímã é o guardião da criança, a própria mãe, com o intuito de afastar o filho da convivência com o pai. O motivo essencial desse comportamento: VINGANÇA. Seja por causa de adultério, por brigas, por um casamento que não deu certo, pela ex-mulher não aceitar um novo relacionamento na vida do pai de seu(sua) filho(a). Ou por esses motivos todos juntos.
O fato é que para as pessoas que lutam incansavelmente para afastar os filhos do pai, basta um copo d’água para desatar uma tempestade.
Esse comportamento, que em síntese, causa uma série de conflitos especialmente para a CRIANÇA, tem raízes profundas. A Síndrome consiste numa série de sintomas, oriundos de comportamentos que se alongam, se agravam e se instalam na vida dos ex-cônjuges e do(s) filho(s).
Mas, o que mais impressiona é que a presença desse comportamento não acontece somente na vida de pais separados. Ela essencialmente começa DURANTE O CASAMENTO. E em muitos, muitos casos, o casal nem chega a separar-se. Casados, vivem um inferno conjugal, e passam a usar de artifícios dentro do próprio relacionamento para fazer dos filhos seus aliados.
“A sua mãe, aquela…”… “O seu pai… aquele…”
A enlouquecida e infeliz vida conjugal se torna uma desequilibrada vida em ‘família’. E para manter as aparências, esse casamento se arrasta por anos, e quando há a separação de fato, e também de Direito, essa ferida salta e vai parar, em muitos casos, nas delegacias de polícia.
O que era vida privada, se torna questão pública. O que era somente entre quatro paredes, vira tema judicial. E na maioria dos casos, baseada em MENTIRAS. DIFAMAÇÃO. FALSAS DENÚNCIAS E ACUSAÇÕES. Até o acusado defender-se, já se passou tempo suficiente para o guardião fazer literalmente a ‘caveira’ do outro genitor.
Nas investigações mais aguçadas de psicológos e assistentes sociais, fica óbvio o discurso maligno do guardião da criança que desde cedo já plantava sementes de discórdia contra o outro para afastar o afeto entre os dois.
Além das mentiras, o comportamento manipulador do guardião se encobre por falsos sentimentos de amor, de cuidade e de afeto. ‘Um papel de presente bonito para envolver um presente estragado.’
Outro dia conversava com uma amiga advogada, que era (no passado, era) uma ativista sincera das questões de gênero, especialmente no que se referia à violência contra a mulher… Nossa conversa parou num ponto extremo e essencial. Ela não mais advoga em favor de uma causa única,  em favor de ‘gênero’, e eu perguntei a ela porquê. A resposta:
“Amiga, porque percebi que em muitos casos a catarse não corresponde ao discurso”.
Simplificando: nesses casos, os quais a amiga se refere, o discurso da mulher sobre o homem é um…  Mas a realidade demonstra ser outra.
Sim, a realidade em muitos casos não é a dos boletins de ocorrência.
Não que essa não seja uma causa justa. A violência contra a mulher é tão cruel quanto a violência contra as crianças. Mas a questão é que emocionalmente afetada, a mulher pode utilizar-se de falsas acusações, falsas denúncias, falsas desmoralizações para afastar o filho da convivência do Pai e destruir com a vida do ex-cônjuge que supostamente “desgraçou a sua vida”.
A vitimização nesses casos não é um projeto legítimo. Ela encobre a Vingança, repetimos. Ela esconde o desejo incontrolável do guardião da criança em destruir com a vida daquele que um dia foi casado.
Seria talvez pelo desejo incofesso de que  gostaria que este continuasse a ser seu companheiro?
Movimento Filhos Felizes

sexta-feira, 13 de julho de 2012

AS VÍTIMAS SOMOS NÓS - Conflitos Que é feito dos filhos que sobram da guerra entre os homens e as mulheres?

Conflitos
Que é feito dos filhos que sobram da guerra entre os homens e as mulheres?
22.04.2012 - 15h28 Graça Barbosa Ribeiro
Com o divórcio de pais habituados a cuidar dos filhos, a tendência para o litígio pode acentuar-se. Associações alertam para fenómeno da "alienação parental", que alguns dizem não existir.
Sob a vigilância de uma funcionária, numa sala de um dos edifícios da Segurança Social em Lisboa, Luís, de 48 anos, manobra um carro telecomandado. Fá-lo seguir até ao compartimento contíguo, onde o seu filho está com a avó materna, e regressar, depois, à sala onde se encontra. Ele, Luís, não pode cruzar-se com a família da ex-companheira. Por isso pediu o carro a um sobrinho e o manobra, agora, entre uma e outra sala, a engolir as lágrimas e a humilhação. Tenta atrair Pedro, de quatro anos, que finalmente chega à ombreira da porta e, por uns segundos, levanta os olhos do carro para o pai. Nesse momento, a avó faz barulho com os sacos e o miúdo desaparece. Luís ouve: "Não vás embora, avó!". A visita terminou.

A descrição é feita com base no relato de Luís. É a sua versão de um drama cuja veracidade sustenta em documentos e estudos e relatórios e notificações do tribunal e contas de advogados – "um monte de papéis inúteis" sobre os quais chora. A relação de normalidade com o filho terminou dias antes de o bebé completar os dois anos de idade. Hoje, Pedro tem cinco anos e não voltou a estar com o pai sem a vigilância de terceiros. Luís tornou-se no retrato daquilo a que alguns chamam vítima de "alienação parental" – o termo utilizado para designar o comportamento, em casos de divórcio litigioso, do progenitor que tem a guarda física do filho e que, perante a criança, procede a uma permanente desqualificação do outro progenitor, ao mesmo tempo que procura obstar ao contacto entre ambos, com a intenção de provocar o corte dos vínculos afectivos que os unem.

Nas vésperas do dia Internacional de Consciencialização da Alienação Parental, que se assinala dia 25, o problema mobiliza várias organizações. Entre elas os dirigentes das associações Para a Igualdade Parental (APIP) e da Pais Para Sempre (APPS), que citam dados oficiais para lembrar que, só em 2010, houve 27.556 divórcios em Portugal e deram entrada nos tribunais 16.836 processos de regulação do exercício das responsabilidades parentais e 11.283 processos por incumprimento do regime acordado (de contactos ou de pagamento de pensões de alimentos). "Com o divórcio dos homens da geração pós-25 de Abril, que foram educados num ambiente de partilha, com as mulheres, das tarefas domésticas e dos cuidados dos filhos, a tendência é para que cada vez mais pais reclamem a sua guarda, o que pode potenciar os conflitos", afirma Ricardo Simões, da APIP.

O conceito de alienação parental, contudo, é controverso. Aparentemente, a alienação parental existe e começa a ser reconhecida: o termo aparece cada vez com maior frequência em sentenças dos tribunais, como motivo para a inversão da guarda física das crianças. Os juízes que procuram utilizá-lo, no entanto, enfrentam a aguerrida e sistemática contestação de um grupo de especialistas, cujos rostos mais mediáticos são Clara Sottomayor e Dulce Rocha, ambas fundadoras da Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, a primeira professora de Direito na Universidade Católica e a segunda presidente executiva do Instituto de Apoio à Criança.

Não é fácil explicar em poucas linhas o motivo da controvérsia, comum a Portugal, aos Estados Unidos, a Espanha e ao Brasil, por exemplo. De uma forma simplista, pode afirmar-se que a contestação se baseia em três factores: na designação original, que é "síndrome da alienação parental", indicando um comportamento patológico; no facto de o conceito não ser reconhecido como válido por qualquer autoridade de saúde; e por o termo ter sido criado por um psiquiatra dos EUA permissivo em relação aos contactos sexuais entre pais e filhos, Richard Gardner, cujas teorias, denuncia Clara Sottomayor, "têm uma origem sexista e pedófila".

O último aspecto é essencial, também, para Dulce Rocha, que não se limita a contestar a validade do conceito e nega mesmo a possibilidade de uma mãe tentar quebrar o vínculo entre pai e filho com outra intenção que não a da protecção da criança face a uma ameaça que pelo menos julga real. Apontando casos de erros judiciários, ambas consideram que a alegação de "alienação parental" "é usada para encobrir abusos sexuais dos filhos pelos homens" e constitui uma "discriminação das mulheres, encaradas como loucas, perversas, histéricas e manipuladoras".

"Ridículo", reage Maria Saldanha, psicóloga e presidente do Instituto Português de Mediação Familiar. Pioneira no tratamento do tema da alienação parental em Portugal, defende a necessidade de, pelo contrário, proteger a relação da criança com o pai de falsas acusações de abuso sexual. A psicóloga chama-lhe "bomba atómica". "Primeiro usam-se os argumentos do quotidiano: num fim-de-semana a criança não vai ter com o outro progenitor porque tem uma festa, no outro porque está doente, depois porque precisa de estudar.... Mas, nos casos mais graves, acabam por surgir as acusações de abuso, que têm um efeito devastador", diz. Isto porque, confirmam os juízes, mediante aquela acusação ou da de violência doméstica, o tribunal interrompe as visitas ou estabelece um regime de encontros vigiados, como medida de protecção da criança.

Maria Saldanha considera que a lentidão do sistema "premeia o alienador". "Por longos períodos de tempo, a criança não se encontra com um dos progenitores ou apenas o vê uma ou duas horas por semana, com vigilância, o que dá oportunidade ao outro de consolidar o processo de alienação", acusa.

A interferência da questão do género nesta discussão é inevitável, na medida em que, no âmbito da regulação do exercício das responsabilidades parentais, os tribunais continuam a atribuir a guarda física da criança à mãe, na grande maioria dos casos, pelo que são elas que mais têm o poder de alienar. A forma como o confronto entre os direitos do homem e da mulher condiciona o debate ficou evidente em Novembro, quando duas associações interpuseram uma providência cautelar no sentido de impedir que figuras do Estado patrocinassem um congresso sobre O Mito da Síndrome da Alienação Parental. Alegaram (sem êxito) que o evento estava a ser promovido por mulheres (numa aparente alusão a também Clara Sottomayor e Dulce Rocha) que, "mais do que pró-feministas", eram "anti-homem" e pretendiam "lançar um clima de suspeição" sobre todos os pais.

"Esta guerra ideológica em torno do tema da alienação parental, explorada por ambas as partes de forma demagógica e como se fosse um problema de género, tem sido extremamente prejudicial à defesa dos interesses da criança", considera Catarina Ribeiro, docente da Universidade Católica e psicóloga no Instituto Nacional de Medicina Legal. Defende que o termo "é o menos importante": "O comportamento descrito como alienação parental existe e é relevante. É verdade que em caso de litígio há acusações de abusos sexuais falsas e verdadeiras - e o que é que se faz perante isto? Não se discute como havemos de lhe chamar - estuda-se, investiga-se e criam-se condições para um despiste rápido e eficaz das falsas acusações", defende.

Em Maio de 2009, na primeira audiência para a regulação do exercício das responsabilidades parentais, Luís tomou conhecimento de que existia uma queixa-crime contra ele, por abuso sexual. Na sessão, o acordo que vigorara até a família materna ter subtraído a criança (que passava um dia com o pai, outro com a mãe) não chegou a ser equacionado. Ficou definido que as visitas passariam a ser semanais e vigiadas. Mas nem isso aconteceu – um engano numa morada fez com que Luís só voltasse a estar com o filho nove meses e meio mais tarde.

Desde aquela data, as interrupções dos contactos, por períodos mais ou menos longos, são constantes e, nos encontros, Luís percebeu que o filho passou a chamar "pai-avô" ao seu ex-sogro. Seguindo a tese de Maria Saldanha, é uma vítima típica de alienação parental. A acusação de abusos só surgiu em contexto de litígio pela guarda da criança e acabou por ser arquivada, há quatro meses. Luís espera que esse facto permita alterar o regime de visitas. Algo que, de acordo com os princípios defendidos por Dulce Rocha e Clara Sottomayor, não deve acontecer.

"Não ficar provado que houve abuso não significa que ele não tenha existido, pelo que o tribunal deve proteger a criança. Pior do que crescer sem pai é crescer junto de um pai abusador", afirma a professora de Direito. "Mas está o tribunal a proteger a criança ao cortar os vínculos com um dos progenitores, entregando-o a alguém que, pela mesma ordem de razões, pode ser um manipulador, um abusador emocional?", questiona António José Fialho, juiz de Direito do Tribunal de Família e Menores do Barreiro.

Interessado na questão da alienação parental e empenhado na promoção do debate, este juiz afirma que nunca utilizou aquela expressão numa sentença, mas que já se baseou no novo artigo da Lei do Divórcio, de 2008, que determina que, ao atribuir a guarda física da criança, o tribunal deve promover decisões "que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos [os progenitores]". "Não é por falta de leis que não tomamos sempre as melhores decisões, mas por falta de recursos. Já cheguei a esperar um ano e meio por um relatório de avaliação social e, neste momento, sei de exames pedopsiquiátricos marcados para 2013", exemplifica.

No Centro de Direito da Família, em Coimbra, o procurador Rui do Carmo coordena uma equipa multidisciplinar que trabalha em várias propostas de solução para uma actuação rápida e eficaz em situações de denúncia de abuso sexual, que espera testar no terreno nos próximos meses. "Começa a cansar a permanente denúncia dos problemas, é preciso passar à acção", critica.

No que respeita à chamada alienação parental, o presidente da Comissão Nacional de Protecção das Crianças e Jovens em Risco, Armando Leandro, defende que agir é "promover acções de prevenção, mas também aplicar as sanções previstas na lei". E também neste campo o ano de 2008 trouxe novidades: incorre em pena de prisão até dois anos e multa até 240 dias o progenitor que de modo repetido e injustificado não cumpra o regime estabelecido para os encontros com o outro progenitor. O crime de denúncia caluniosa – neste caso a acusação falsa de abusos sexuais – é punido com pena de prisão até três anos ou multa.

Apresentar queixa, no entanto, é algo que "não passa pela cabeça" de Luís, por exemplo: "O que eu pretendo é evitar problemas, para ter de volta o meu filho", explica. Esta semana, dizia-se esgotado: "Já não confio na Justiça, não sei a quem recorrer".

Ricardo Simões, da APIP, admite que há muitos pais e mães que não resistem ao esgotamento provocado por estes processos. "Não se trata de desistir dos nossos filhos. Eu não desisti. Mas não podia continuar a viver o processo com a mesma intensidade – era uma questão de preservação da saúde mental", diz Cristina, de 42 anos. O filho, agora com 15, escolheu viver com o pai depois de um mês de férias em sua casa, aos 13. Desde então, as relações têm vindo a deteriorar-se. "Começo a conformar-me com a ideia de que tenho de esperar que ele amadureça", diz.

A "espera", no entanto, pode não vir a ser compreendida pelos filhos. É o que diz Sara, que só em adulta soube o que se passou no tribunal, tinha ela 13 anos. "A minha mãe disse que se suicidava se lhe tirassem os filhos e eu e o meu irmão ficámos entregues a uma mulher mentalmente desequilibrada", resume. Sara culpa a mãe e não perdoa ao pai "que se tenha rendido, que não tenha lutado" por ela "até ao limite das suas forças".

Hoje com 42 anos, Sara diz que, se há algo que a define, é "a absoluta intolerância, aos erros, à negligência e à indiferença dos adultos em relação às crianças". Às vezes dá consigo "a fazer coisas que aos olhos dos outros podem parecer estranhas". Há tempos, estava num café, em Cascais, quando entrou uma mulher jovem empurrando um carrinho com um bebé recém-nascido, conta. Apesar de a criança estar a chorar, a mãe mantinha-se indiferente e Sara não se conteve. "Dirigi-me ao carrinho, peguei no bebé, coloquei-lho no colo e quando a mulher olhou para mim, horrorizada, disse-lhe: 'O seu bebé tem fome, sede, dor ou sono. Cuide do seu filho! É sua obrigação cuidar do seu filho!'".


(Os nomes das pessoas que se declararam vítimas de alienação parental são fictícios).

quinta-feira, 5 de julho de 2012

QUEM TEM COMPETENCIA PARA EDUCAR???? - ALIENAÇÃO PARENTAL

 MINHA FILHA, ESTA A MERCÊ DE UMA EDUCAÇÃO "PAGA", PORÉM DESINTERESSADA, CÓTICA, CANHESTRA, SEM FISCALIZAÇÃO, DEIXADA A DERIVA POR UM ESTADO OMISSO EM SUAS RESPOSNSABILIDADES, POIS FISCALIZAR, É UM DEVER E UM DIREITO DESSAS CRIANÇAS QUE ESTÃO SENDO EDUCADAS CIBERNETICAMENTE TERCEIRIZADAS, SAEM DAS ESCOLAS SABENDO OPERAR UM COMPUTADOR COMO NÍNGUÉM, + COMPLETAMENTE LEIGAS NO QUESITO CULTURA , E SABER!
Não tenho parcela nesta aberração escolar, por que EU sou ALIENADA EM SUA FORMAÇÃO ESCOLAR, o guardião, decide tudo e blinda tudo, desde os 05 anos dela!







O texto é de Lia Luft. A realidade é de muit@s e tant@s menin@s que cotidianamente são seqüestrad@s do mapa da cidadania e apartad@s das oportunidades sociais.
A educação pública no Brasil está doente. É a crônica do descaso. De escolas que caem por falta de verbas no contraponto de recepções milionárias às autoridades. Na visita da presidenta Dilma a Alagoas , ocorrida em 25 de julho, o Governo do Estado dos invisíveis flagelados da última enchente, líder do analfabetismo, um território dos muitos pobres de marré marré deci lançou mão de R$ 144.225,08, sem concorrência pública para um comitê de recepção.
As muitas fórmulas miraculosas , do estado brasileiro, para "revolucionar" a educação pública tem deixado muita gente órfã da cidadania verdadeira: ler, escrever e interpretar o mundo com seus significados e diferenças.
'Educação: reprovada', um artigo de Lya Luft
Há quem diga que sou otimista demais. Há quem diga que sou pessimista. Talvez eu tente apenas ser uma pessoa observadora habitante deste planeta, deste país. Uma colunista com temas repetidos, ah, sim, os que me impactam mais, os que me preocupam mais, às vezes os que me encantam particularmente. Uma das grandes preocupações de qualquer ser pensante por aqui é a educação. Fala-se muito, grita-se muito, escreve-se, haja teorias e reclamações. Ação? Muito pouca, que eu perceba. Os males foram-se acumulando de tal jeito que é difícil reorganizar o caos.
Há coisa de trinta anos, eu ainda professora universitária, recebíamos as primeiras levas de alunos saídos de escolas enfraquecidas pelas providências negativas: tiraram um ano de estudo da meninada, tiraram latim, tiraram francês, foram tirando a seriedade, o trabalho: era a moda do "aprender brincando". Nada de esforço, punição nem pensar, portanto recompensas perderam o sentido. Contaram-me recentemente que em muitas escolas não se deve mais falar em "reprovação, reprovado", pois isso pode traumatizar o aluno, marcá-lo desfavoravelmente. Então, por que estudar, por que lutar, por que tentar?
De todos os modos facilitamos a vida dos estudantes, deixando-os cada vez mais despreparados para a vida e o mercado de trabalho. Empresas reclamam da dificuldade de encontrar mão de obra qualificada, médicos e advogados quase não sabem escrever, alunos de universidades têm problemas para articular o pensamento, para argumentar, para escrever o que pensam. São, de certa forma, analfabetos. Aliás, o analfabetismo devasta este país. Não é alfabetizado quem sabe assinar o nome, mas quem o sabe assinar embaixo de um texto que leu e entendeu. Portanto, a porcentagem de alfabetizados é incrivelmente baixa.
Agora sai na imprensa um relatório alarmante. Metade das crianças brasileiras na terceira série do elementar não sabe ler nem escrever. Não entende para o que serve a pontuação num texto. Não sabe ler horas e minutos num relógio, não sabe que centímetro é uma medida de comprimento. Quase a metade dos mais adiantados escreve mal, lê mal, quase 60% têm dificuldades graves com números. Grande contingente de jovens chega às universidades sem saber redigir um texto simples, pois não sabem pensar, muito menos expressar-se por escrito. Parafraseando um especialista, estamos produzindo estudantes analfabetos.
Naturalmente, a boa ou razoável escolarização é muito maior em escolas particulares: professores menos mal pagos, instalações melhores, algum livro na biblioteca, crianças mais bem alimentadas e saudáveis – pois o estado não cumpre o seu papel de garantir a todo cidadão (especialmente a criança) a necessária condição de saúde, moradia e alimentação.
Faxinar a miséria, louvável desejo da nossa presidenta, é essencial para nossa dignidade. Faxinar a ignorância – que é uma outra forma de miséria – exigiria que nos orçamentos da União e dos estados a educação, como a saúde, tivesse uma posição privilegiada. Não há dinheiro, dizem. Mas políticos aumentam seus salários de maneira vergonhosa, a coisa pública gasta nem se sabe direito onde, enquanto preparamos gerações de ignorantes, criados sem limites, nada lhes é exigido, devem aprender brincando. Não lhes impuseram a mais elementar disciplina, como se não soubéssemos que escola, família, a vida sobretudo, se constroem em parte de erro e acerto, e esforço. Mas, se não podemos reprovar os alunos, se não temos mesas e cadeiras confortáveis e teto sólido sobre nossa cabeça nas salas de aula, como exigir aplicação, esforço, disciplina e limites, para o natural crescimento de cada um?
Cansei de falas grandiloquentes sobre educação, enquanto não se faz quase nada. Falar já gastou, já cansou, já desiludiu, já perdeu a graça. Precisamos de atos e fatos, orçamentos em que educação e saúde (para poder ir a escola, prestar atenção, estudar, render e crescer) tenham um peso considerável: fora isso, não haverá solução. A educação brasileira continuará, como agora, escandalosamente reprovada
Fonte: Raizes da África