NOSSA LUTA

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

PORQUE OS ALIENADORES, NÃO ACEITAM A PARENTABILIDADE DA CRIANÇA QUE ELES ALIENAM? MINHA FILHA NÃO CONHECE NENHUMA DE SUAS PRIMAS....


1.1. Aspectos Relacionais do Sistema Familiar e a Dinâmica da Síndrome da Alienação Parental (SAP)

Nas relações familiares tradicionais percebemos claramente que cada membro possui seu lugar bem atribuído. Goudard (2008) chama atenção para as relações primárias estabelecidas entre pai/mãe-filho(a). Segundo ela, a mãe apresenta uma relação fusional com o feto desde os primeiros meses de vida. Já o pai assumirá o papel de um terceiro, que tanto influirá nessa relação fusional, como guiará a criança no despertar para o mundo externo.
Esse caráter fusional pode ser comparado ao que Winnicott (1997) chamou de “preocupação materna primária”, onde a criança é associada pela mãe como um “objeto interno”, criando uma relação onde ela desvia o interesse do seu próprio self para o bebê. Ou seja, existe uma identificação cada vez maior da mãe para com o filho, a ponto de este ser imaginado como um “objeto” a ser instalado dentro dela e lá permanecer. Todas as fantasias são projetadas sobre o filho, como preocupação materna, na intenção de mantê-lo protegido. E é isso que confere à mãe uma capacidade especial de dispensar os cuidados necessários ao filho.
A estrutura relacional pai-mãe-filho(a) representa a tríade onde cada membro é igualmente responsável pela manutenção de um sistema familiar funcional. Segundo Winnicott (1993 apud PLASTINO, 2010), desde as relações primárias da criança, o ambiente externo assume a responsabilidade de conduzir de forma saudável ou não todo o ciclo do desenvolvimento. A tríade, portanto, assegura que cada um esteja adequadamente nesse exercício de seus papéis. Genitores que buscam a proteção dos filhos, respeitando e atendendo as necessidades fundamentais para sua formação enquanto sujeitos, e filhos que se colocam em seu papel de respeitar os pais, estando atentos ao modelo de relações interpessoais que lhes é passado.
Bowen (1979 apud SANTOS, 2008) aborda o conceito de triângulo ou tríade como sendo a base da construção do sistema relacional na família. O triângulo, segundo ele, é coordenado pela ansiedade que determina os níveis de proximidade e distanciamento entre os membros. Quando ocorre algum conflito emocional a reatividade dos membros gera a ansiedade no sistema familiar que ordena a busca de um terceiro elemento para ecoá-la. Assim, a tríade é direcionada para o que Bowen chama de triangulação, descrevendo esse processo reativo.
Na triangulação há sempre uma díade e um terceiro elemento ou pessoa. Quando a díade ou o par enfrenta um nível elevado de ansiedade, um dos membros se dirige a um terceiro para aliviar as tensões. Nos casos de separação conjugal com litígio, tem-se observado o movimento em que um dos ex-cônjuges alia-se ao(s) filho(s) para aliviar as tensões da relação conjugal e acaba transferindo para a relação parental. Pode-se afirmar, portanto, que uma separação conjugal litigiosa irá favorecer a formação da triangulação.
É importante compreender que a forma de vinculação entre os pais precisará ser reorganizada de modo que, mesmo não existindo mais a vida conjugal, a parentalidade permanece. Um problema recorrente diante desses fatos é que nem sempre os pais conseguem manter uma área de entendimento entre si e os conflitos interparentais vão dificultar o ajustamento da criança após o divórcio. Segura e Sepúlveda (2006) ressaltam que o fato dos pais decidirem por fim a sua vida em comum deixa de ser saudável quando envolvem os filhos nos conflitos que geram a separação, pois estes acabam tomando partido dos problemas dos adultos.
Sentimentos não resolvidos após a experiência conflituosa da separação, como a mágoa, as desilusões e as expectativas não satisfeitas, mobilizam um ou ambos os ex-cônjuges. Nesse sentido, busca-se responsabilizar o outro pela experiência negativa que enfrentam, por desejo de vingança ou com receio de ter a criança afastada por ele (PAGANINI; MAILLARD, 2005).
Essas questões induzem, frequentemente, ao exercício abusivo do direito de guarda por parte dos pais separados.  A psicóloga Leila Torraca de Brito (1999) pontua o quanto problemas emocionais e questões jurídicas encontram-se entrelaçados, justificando o fato de que os filhos são utilizados nesse momento difícil de separação para determinar quem possui melhores condições de assumir a guarda.
Inúmeras questões são levantadas durante essa tentativa de instituir um genitor como guardião, após o divórcio. Considerar com quem a criança possui maior ligação emocional, por exemplo, é um risco de acatar o que muitas vezes parece óbvio. É comum que os processos judiciais levem tempo para ser concretizado o rompimento matrimonial e, durante esse período que a criança passa junto com um dos genitores surge uma maior aliança entre eles (BRITO, 1999).
Karam (1998 apud BRITO, 1999) chama atenção para a prática, aqui no Brasil, de atribuir a guarda dos filhos à mãe, cabendo ao pai apenas a visitação quinzenal. Isso se encontra alinhado aos fatores histórico-culturais, que podem ser mais bem compreendidos quando recorremos ao processo de reconfiguração do modelo de família. É um percurso que vem exigindo não só a adaptação de seus membros, mas uma nova elaboração dos papéis de pai e mãe.
As perspectivas em relação à paternidade, de acordo com Fein (1978 apud DANTAS et al, 2004), se diferem segundo os modelos de família tradicional, moderna e emergente. No primeiro caso, o pai é o provedor e atua dando suporte emocional à mãe, mas sem se envolver diretamente no cuidado para com os filhos. Já na moderna, ele exerce seu papel no desenvolvimento moral, educacional e emocional. A emergente, por sua vez, enfatiza que eles são capazes de participar ativamente desses processos na criação das crianças.
Diante disso, Jablonski (1999 apud DANTAS et al, 2004) mostra que “o homem parece confuso diante de tantas mudanças e a elaboração do novo papel ocorre lentamente” (p.350). Segundo ele, o pai demonstra interesse em participar cada vez mais da vida dos filhos, mas dificilmente essa atitude é colocada em prática na divisão de tarefas com a mãe. Isso ocorre, principalmente, no contexto do divórcio quando o processo não se dá de maneira pacífica, devido às próprias implicações da separação.
Esse fato acaba sugerindo que o pai possui escassas influências na educação e cuidado dos filhos e, portanto, não está apto a exercer a guarda. Porém, o que se sabe é que ambos os genitores reúnem condições favoráveis de dispensar essa atenção às necessidades do desenvolvimento de suas crianças. Contudo, os referenciais jurídicos que embasam essas decisões de guarda não cabem ser aprofundados neste estudo.
De acordo com pesquisas avaliadas por Ramires (1997 apud DANTAS et al, 2004), para compensar a ausência diária, o genitor que vive fora do lar busca uma vivência de maior qualidade nos períodos em que lhe é permitido estar com o filho. Entretanto, os mesmos autores apontam controvérsias em outras pesquisas citando que o contato entre pai e filho se estreita mais após a separação. O recorte é trazido para melhor explicar que essas questões de atenção e cuidado ao filho por parte do pai como “visitante” ainda é bastante flutuante, podendo variar a depender do caso.
Esse papel de visitante pode sofrer interferências inclusive por parte do genitor guardião, lugar atribuído às mães com mais frequência. Isso ocorre por uma postura ambivalente das mães, que por um lado exigem a participação mais ativa do pai, mas ao mesmo tempo resiste em deixá-lo agir. Numa separação litigiosa, a própria dificuldade em lidar com o término do relacionamento pode corroborar para que um dos genitores dificulte o contato entre o outro genitor e os filhos. É o que esclarece Simão (2007 apud SOUSA, 2010), ao afirmar que quando não há um conformismo com a separação, por parte dos genitores, certamente as consequências recairão sobre os filhos e poderá fomentar o distanciamento entre eles.
O melhor interesse da criança não pode ser considerado de forma isolada do entendimento sobre os direitos e deveres dos pais, como alerta Théry (1988 apud BRITO, 1999). Esse pode ser considerado o ponto inicial de um percurso conturbado, pois as necessidades da criança, que deveriam ser priorizadas pelos genitores, são colocadas em segundo plano já que vem sendo incorporado um exercício abusivo da guarda pelo genitor que a mantêm.
Diante de um grave problema familiar, social e jurídico que dificulta o contato pacífico entre pais e filhos separados pelo rompimento entre casais, o psiquiatra Richard Gardner (1985) – professor da Clínica Infantil da Universidade de Columbia e membro da Academia norte-americana de Psiquiatria da Criança e do Adolescente – atendo-se ao movimento de alienação de crianças nesse contexto, definiu teoricamente a Síndrome da Alienação Parental (SAP). Nome atribuído à campanha de desmoralização do outro, onde o guardião atrai a cumplicidade do filho e passa a manipular a construção de uma imagem negativa do genitor não-guardião (DUARTE, 2010).
Houve muitas controvérsias a respeito da terminologia adequada, onde muitos sugeriam tratar de Alienação Parental (AP) e não como uma síndrome. A alegação era de que não se podia falar de psicopatologia enquanto essa entidade não estivesse identificada na atual versão do Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (DSM-IV). Porém, o próprio Gardner (1945a) pontua que as pesquisas referentes a SAP enquanto um transtorno decorrente da alienação parental era pouco presente na literatura científica, em que consiste a não especificação no DSM-IV publicado em 1984. Não justifica afirmar que a SAP de fato não existia, visto que um dos critérios para essa admissão diz respeito ao número de publicações e reconhecimento acerca do fenômeno.
É válido ressaltar a diferença entre uma alienação parental simples e a SAP, visto que, a alienação parental é um termo genérico que possui causas distintas. Uma alienação parental simples pode estar associada a diversos fatores que levam a criança a rejeitar um genitor como negligência e parentalidade disfuncionais, abuso físico, emocional ou sexual. Já a SAP está ligada exclusivamente à campanha de manipulação que a criança sofre, e deve ser entendida como um subtipo da alienação parental. Sua determinação enquanto síndrome é referente ao conjunto de sintomas presentes na criança, e que aparecem juntos ou estão ligados a uma etiologia comum (GARDNER, 1945a).
Os personagens reais desse conflito passam por turbulências que afetam todas as formas de relacionamentos. São pais programando seus filhos contra o outro genitor. A criança que sofre essa espécie de manipulação é chamada de alienada e passa a ser o objeto do genitor alienador. Segundo Duarte (2010), o alienador suprime do ex-companheiro um direito de convivência decorrente do poder familiar e, acima de tudo, um direito dos próprios filhos. O genitor alienado, por sua vez, vai aos poucos sendo destituído do seu lugar de pai, aos olhos da criança que se vê obrigada a não reconhecê-lo como tal.
A SAP é um exemplo característico da triangulação em que o genitor guardião atrai a cumplicidade da criança para colidir com o outro genitor. Inúmeras são as questões que podem provocar maior desconforto em um dos ex-cônjuges, movendo-o para buscar na criança um apoio ou mesmo uma forma de enfrentamento da ansiedade gerada no sistema. Assim, o genitor alienador após o rompimento da relação com o par, se alia à criança. Na figura abaixo (Fig.1) é possível observar como se configura esse processo.



TE AMO FILHA!

Um comentário:

Mahgaroh Prats disse...

Aspectos Relacionais do Sistema Familiar e a Dinâmica da Síndrome da Alienação Parental (SAP)
Nas relações familiares tradicionais percebemos claramente que cada membro possui seu lugar bem atribuído. Goudard (2008) chama atenção para as relações primárias estabelecidas entre pai/mãe-filho(a). Segundo ela, a mãe apresenta uma relação fusional com o feto desde os primeiros meses de vida. Já o pai assumirá o papel de um terceiro, que tanto influirá nessa relação fusional, como guiará a criança no despertar para o mundo externo.